Sustentabilidade e inovação ambiental em ação
Profª Nídia Caetano- Presidente do Conselho Diretivvo da APESB
A APESB – Associação Portuguesa de Engenharia Sanitária e Ambiental tem sido um ator fundamental na promoção de soluções sustentáveis para os desafios da água, saneamento e resíduos em Portugal. Em antecipação à próxima edição da ENERH2O, revela a sua visão sobre o equilíbrio entre inovação e regulação, a resiliência da água e as formas de acelerar a transição ecológica.

- A APESB tem sido uma referência no desenvolvimento de políticas e práticas sustentáveis em engenharia sanitária e ambiental. Como avaliam o equilíbrio entre inovação tecnológica e regulação ambiental em Portugal? A legislação acompanha as necessidades do setor?
A regulação ambiental tem como objetivo fundamental zelar pela minimização de impactos ambientais (negativos) significativos resultantes das atividades das entidades gestoras de águas e resíduos (no caso da esfera de ação da APESB), e também dos cidadãos na medida em que as suas ações individuais podem agravar ou diminuir esses impactos. Contudo, a regulação deve ser equilibrada, no sentido de promover ou, pelo menos, não obstaculizar a inovação e desenvolvimento tecnológico. Sendo um equilíbrio difícil, na perspetiva da APESB, em algumas dimensões, de facto, o equilíbrio não tem sido conseguido, e a regulação tem sido um obstáculo ao desenvolvimento da economia circular quer no setor dos resíduos quer no setor das águas. Um excesso de zelo tem impedido que a implementação de simbioses industriais e o encerramento de alguns ciclos de materiais ganhem maturidade no Mercado, mantendo-se como exemplos apenas demonstrativos. A crescente pressão sobre os recursos hídricos exige soluções cada vez mais sofisticadas.
- Qual o papel da engenharia sanitária e ambiental na resiliência hídrica e quais são as principais estratégias que podem ser implementadas para minimizar o stress hídrico?
A Engenharia Hidráulica e Sanitária, assumem neste contexto a maior relevância. Desde logo através da elaboração de estudos rigorosos, sistémicos e integrados. A escala de análise dos fenómenos hidrológicos é, desde logo, fundamental. Por outro lado, a automação associada à sensorização permite a recolha de informação em prazos de tempo muito mais curtos, com respostas mais céleres às perturbações ocorridas. O tratamento criterioso e informado destes dados é chave para uma deteção atempada de disrupções ou perdas no Sistema. Por outro lado, a Engenharia Sanitária é chave no desenvolvimento e implementação de soluções para resolução de muitos dos problemas atualmente existentes nas infraestruturas. A resiliência hídrica resultará de um equilíbrio entre a oferta e a procura de água no tempo e no espaço. Uma abordagem integrada das diferentes fontes de água (as tradicionais: águas subterrâneas e superficiais; e as novas: água residual tratada para reutilização, água do mar tratada por dessalinização, águas pluviais, por exemplo) e a racionalização da procura são as estratégicas defendidas pela APESB. Neste debate, em particular quando se analisa a procura, é essencial a consideração do valor económico, social e ambiental que cada uso aporta, de forma integrada nos diversos setores de atividade.
- O setor do saneamento e gestão de resíduos tem enfrentado desafios crescentes com a urbanização acelerada e as alterações climáticas. Como vê a APESB a necessidade de adaptação das infraestruturas existentes e quais são as soluções emergentes que podem fazer a diferença?
A Urbanização não é um fenómeno recente, foi-se intensificando gradualmente, ao longo do tempo, criando unidades territoriais fortemente dependentes nas suas dimensões essenciais, como sejam o provimento de bens e serviços essenciais, como sejam o provimento de alimentação, água e energia. Por outro lado, e apesar de várias iniciativas comunitárias e nacionais, seja através do estabelecimento de metas de recolha e valorização cada vez mais ambiciosas, seja através do estímulo à redução da produção de resíduos e consumo de materiais, a quantidade global de resíduos produzidos não tem parado de aumentar em Portugal, enquanto a parte valorizável destes resíduos recolhidos seletivamente não tem aumentado. Comparativamente, as alterações climáticas são um fenómeno mais recente, contudo mais incerto, variando as previsões dos seus efeitos quer em termos de severidade, quer de probabilidade de ocorrência, o que coloca enormes desafios à gestão de infraestruturas. Acresce que a alteração dos padrões de consumo das sociedades, nomeadamente no que à indústria farmacêutica e de cuidado pessoal diz respeito, tem alterado as caraterísticas das águas residuais em dimensões de qualidade que podem fazer perigar a saúde pública. Integra-se aqui a questão dos poluentes emergentes. A densificação do espaço urbano e a sua impermeabilização elevam a gestão das águas pluviais, quer em quantidade quer em qualidade, a um novo patamar de exigência e cuidado.
- O evento ENERH20 tem servido como um ponto de convergência para especialistas e entidades do setor. De que forma este tipo de iniciativas contribuem para acelerar a transição para uma gestão mais eficiente e sustentável dos recursos hídricos e ambientais?
Eventos como o ENERH20, contribuem para uma gestão mais eficiente e sustentável fundamentalmente pela visibilidade que dão quer aos problemas enfrentados pelos setores, quer às soluções disponíveis no mercado, desmistificando alguns tabus e promovendo a partilha de conhecimento entre setores, contrariando a tendência anterior em que o conhecimento de um determinado setor, só servia para esse mesmo setor. Atualmente, a visão integrada das situações, permite a criação de soluções mais abrangentes e integradoras.
- Num contexto de transição ecológica, quais devem ser as prioridades estratégicas para o setor nos próximos anos e que papel pode a APESB desempenhar para garantir que Portugal esteja na vanguarda da sustentabilidade ambiental?
A APESB contribui para colocar Portugal na vanguarda da sustentabilidade ambiental de várias formas. Por um lado, a APESB, sendo a representante nacional quer na International Water Association (IWA), quer na International Solid Waste Association (ISWA), funciona como um canal bidirecional de divulgação de conhecimento técnico e científico, promovendo a participação de técnicos e empresas portuguesas nos grupos de trabalho destas organizações mundiais, em iniciativas que estão ao nível do estado-de-arte, e dando a conhecer o que de melhor se faz em Portugal nestes setores nesses fóruns, assim como na definição dos temas abordados nas conferências mundiais organizadas. Paralelamente, a APESB organiza anualmente uma conferência técnico-científica, o ENaSB – Encontro de Engenharia Sanitária e Ambiental, nos anos pares, e as JTIR – Jornadas Técnicas Internacionais de Resíduos nos anos ímpares. Sendo conferências internacionais, todas as edições contam com um ou mais especialistas internacionais na área das águas e/ou resíduos (porque a gestão de águas e águas residuais e a gestão de resíduos apresentam potencial sinérgico). Os autores dos melhores artigos apresentados nas conferências são convidados a submeter uma extensão dos seus artigos ou notas técnicas à Revista Águas & Resíduos (A&R). A Revista A&R é uma revista periódica, com revisão por pares disponível não só aos associados da APESB mas também a todos aqueles que trabalham nestes setores.